sexta-feira, 1 de junho de 2012

Ai, que susto!

Texto e Fotos: Carol Lopes de Andrade
Maio/2012 – São Paulo – SP

Instalação pública do escultor Antony Gormley atrai, de maneira mórbida, a atenção de quem passa pelo centro de São Paulo, até julho.

Dia após dia a monstruosa arquitetura do centro paulistano desperta em seus moradores e visitantes diversos tipos de olhares. De um lado personagens curiosos, extasiados e maravilhados por cada detalhe desta engrenagem urbana sempre em funcionamento. Do outro os “pacientes” do vício visual, aqueles que diante das doses cavalares de caos e stress, já se entregaram a dormência silenciosa, que sentencia o indivíduo a enxergar toda a cidade como uma grande e fedorenta massa cinzenta.
Que muitos sentem raiva de São Paulo, não há dúvidas. Afinal, o relacionamento e a troca entre alguém de carne e osso e o espaço citadino é carregado de emoções reais, sobretudo, na jornada diária que varia entre seis e nove horas ininterruptas de convívio. Não é de se espantar que a imagem do emaranhado de metal esteja diretamente ligada aos triunfos e dissabores de milhões de pessoas.  
 Quem ainda não deixou o escritório onde trabalha, no centro, e caminhou longamente para espairecer as ideias? A maioria, de fato, pratica este exercício dentro dos transportes coletivos, de cabeça baixa, e o coração mais apertado do que a linha vermelha do metrô às 18h. A busca pelas vias que deem mais respiro à vida, geralmente, acaba em olhos fechados e fones enterrados nos ouvidos, no vai e vem da imersão individual, aparentemente, a única no qual vale a pena se render.
 E as pessoas se rendem! Sem qualquer pudor se lançam nesse ambiente introspectivo de amor e ódio. O que coloca à prova toda nossa percepção de cultura. O que é cultura? O que ela provoca nas pessoas? Como ela transforma as pessoas? Como ela potencializa a relação do homem com o espaço? Estamos andando muito apressados? Estamos nos ignorando demais? Estamos aqui o bastante? Estamos vivos?
 As perguntas são muitas, e como sempre a arte surge para nos convidar a pensar. Paralela à mostra “Corpos Presentes – Still Being” do escultor britânico Antony Gormley, acontece em São Paulo, de 12/05 a 15/07, a instalação pública “Event Horizon”. Este é, sem dúvida, um dos convites mais excêntricos que os paulistanos já receberam para desfrutar do visual de sua cidade, considerando que a atenção dos transeuntes é conquistada através da alusão ao suicídio. Para alcançar este objetivo, Gormley espalhou 31 estátuas de homens nus esculpidos em ferro e de tamanho real, alguns deles no topo de prédios na região central de São Paulo, sem, é claro, deixar de causar forte impacto naqueles que facilmente confundem as peças com indivíduos suicidas prontos para o salto final.
 Depois de alguns segundos de reflexão, ou pela providência de alguém mais antenado na agenda cultural paulistana, fica tudo mais claro. Nada de susto! Nem de chamar o Superman. A nossa atenção já foi ganha pela peculiaridade de Gormley, e talvez, agora, deixemos de lado nossa convivência mecânica com o espaço urbano, para que, com o olhar, possamos percorrer mais do que os nossos próprios umbigos.
Segundo o escultor, a grande intenção desta instalação é fazer com que as pessoas olhem para cima, para os lados, que contemplem a cidade e, principalmente, que elas se perguntem “o que aquelas coisas estão fazendo ali?”.  O importante de olhar para este cenário de pedras, além da própria contemplação, é a abertura pessoal que acabamos permitindo quando as frustrações cotidianas surgem e colocam nossa existência em xeque. (Trecho de sua entrevista na Veja)
Aceno neste texto um efusivo obrigado ao artista e sua equipe. Tirar as pessoas do estado de anestesia e fazê-las olhar ao redor não é uma tarefa fácil. Talvez, por uma pequena fração de tempo, só os suicidas conseguissem. 


Informações sobre a mostra:
Antony Gormley – Corpos Presentes
12 de maio a 15 de julho
Local: Subsolo, térreo, mezanino, 1º, 2º e 3º andares.
CCBB SP
Horário: Terça a domingo

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